quarta-feira, 28 de agosto de 2013

O ballet de Luara



Era sábado em 1987. Eu estava perplexa e nostálgica a olhar as sapatilhas que há anos não me serviam mais.
Eu já fui contida e contente, carregava em mim o estômago dum passarinho filhote. Infelizmente me tornei um cão ansioso, e muito comilão, assim o pesadelo começou.

Gosto de almoçar na casa da avó Marta, lá posso comer o que quiser, na hora que quiser. Embora eu tenha perdido o corpo de bailarina e já estar acima do peso, ela diz que devo comer bastante, sem beira. Ela acha que um dia vou parir à beça e por isso preciso de gordura suficiente para suprir os culotes e todas essas coisas biológicas.
 Então, cá estou comendo pela segunda vez e meia o cardápio do almoço; macarrão, maionese, frango assado com farofa e azeitonas. Me lambuzo inteira, o óleo da comida me completa. Até chegar à sobremesa. Poxa, como eu gosto das sobremesas. Na hora que avó grita “Olha a sobremesa” eu posso ouvir ” Olha essa surpresa”, apesar de não ser surpresa, pois, eram sempre as mesmas nos domingos; aquela gelatina colorida, o pote de sorvete, e o pudim. Eu moraria naquele pudim, um mundo de pudim. Eu, a rainha do pudim.
Os meses vão, as roupas vão, os domingos na avó Marta apenas chegam, e os quilos também. Mas não pense que eu só como na casa da avó. Adoro comer em casa, escondida. Pelo menos, adorava. Até a mãe colocar cadeados nos armários das guloseimas e até nos das comidas. Ela quer começar a ser severa e limitada.
Mas logo agora, mãe? Que me tornei essa típica gorda, suada e com dobrinhas?
Ela diz que estou doente, meu colesterol aumentou e a arritmia também.
Os dias, as horas passam, e tudo se transforma numa batalha, na qual estou começando a ter coragem de vencer. A mãe me colocou na academia, mas quando não quero ir porque tenho que estudar, ela diz que continuo a gorda preguiçosa, e às vezes quando quer me fazer chorar, repete centenas de vezes que cheiro a gordura. Imagino que o meu cheiro é o mesmo dos bolinhos de chuva da tia Célia. Meu coração dói.
Começo levar tudo muito a serio, perdi quilos na academia, perdi mais quilos naquele mundaréu de alfaces perdidos no prato. Estou ficando magra, minha vida também. Agora cheiro a flores.  Tudo está ficando leve e muito fino. Minhas roupas, agora, são tamanho infantil, meu pé emagreceu e já não tenho sapatilhas que se ajustem ao meu número de calçado.
A avó Marta está desesperada, enche os olhinhos de água quando me vê rejeitar a sobremesa ou comer um pedaço de frango e ir direto ao banheiro. Ela diz “Como você está miúda, Lua”.
Pelo meu manequim 34, minha altura 1,65 acompanhada do meu peso 38, não posso mais dançar Ballet, a médica me contou que meus ossos estão fracos, minha imunidade baixa e não tenho mais forças nos meus braços e nas minhas pernas. Apesar dos pesares e da luta constante contra a vontade de poder comer meus chocolates e as minhas coxinhas de frango, não vou ganhar peso, pois, não quero mais cheirar a gordura.

Hoje é sábado em 1987... E que saudade das minhas sapatilhas.

sábado, 3 de agosto de 2013

Confissões de Anitta



mais pareço cúmplice do que Anitta
quando o molhado do meu choro
seca na manga da minha camisa
que tem a cor da primavera
e o cheiro da tua brisa.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Ornitofilia e amor

Havia uma pedra no meu sapato. Pelo menos a pedra não era no meio do caminho, como a de Drummond. E se pedra for elogio do poeta? E se pedra virar flor? e se flor virar pedra? Cícero me chamava de flor “Minha flor, minha Lírio, meu dente de leão.” Se em todas as flores surgisse à salvação? Se na vida de Cícero eu for flor, e no fim da história eu virar pólen? Quero ser pólen esperança. Cícero pode ser o passarinho, nossa gloria seria misturar Ornitofilia e amor, pelos mundos e fundos, cantos e encantos.